Quando a comunicação é humana: Juarez Guedes no Ilha Tech

Juarez Guedes e a urgência de reaprender a escutar o eleitor
Quando a comunicação volta a ser humana: o manifesto de Juarez Guedes no Ilha Tech

Entre telas, slogans e algoritmos, há quem ainda acredite que o essencial da política mora no encontro entre emoções e ideias. Foi com essa convicção que o estrategista Juarez Guedes encerrou a Conferência Território – Comunicação e Marketing Eleitoral, realizada no Ilha Tech, em João Pessoa, num discurso que mais parecia um manifesto sobre a alma da comunicação política moderna.

Último palestrante do evento, que também contou com apresentações de Ruy Dantas, Emanoelton Borges e Nathália Rezende, Juarez levou ao palco um mergulho naquilo que ele chama de “sentimento público”: a matéria-prima invisível que conduz o voto, define narrativas e expõe, ao mesmo tempo, a fragilidade e a potência da democracia mediada por dados e telas.

“A primeira grande missão que você aprende no exercício da consultoria com marketing político é o processo constante de aprender a aprender”, afirmou.

“Porque somos muito seduzidos pela autossuficiência, por achar que temos o controle da razão — quando, na verdade, quem define o processo é o eleitor.”

A partir daí, sua fala costurou filosofia, sociologia e prática de campanha, citando Zygmunt Bauman e o impacto de uma sociedade “fluida”, inundada por informações, manchetes e opiniões instantâneas.

“Vivemos um volume de informação tão grande que gera um falso convencimento de conhecimento. A gente lê uma manchete no WhatsApp, escuta dez comentários na GloboNews e se sente com autoridade pra debater qualquer tema. E essa ilusão de conhecimento é o maior inimigo da escuta política.”

Entre o discurso e o afeto: as provocações de Juarez Guedes na Conferência Território

O voto como emoção compartilhada

Guedes propôs uma leitura humana do processo eleitoral. Para ele, a decisão de voto é, antes de tudo, um fenômeno emocional. “Pensamos o que sentimos, votamos o que sentimos”, citou, lembrando o livro Gestionar las emociones políticas, de Antoni Gutiérrez-Rubí.

Sua tese central é clara: a comunicação política precisa provocar movimento, não apenas transmitir mensagens. “Se não provocar movimento, ela é ruído”, disse, enquanto analisava peças de campanhas que se tornaram símbolos — e não apenas anúncios.

Entre os exemplos, destacou o case da campanha de reeleição do governador João Azevêdo (PSB), na qual atuou como estrategista digital e que rendeu à equipe prêmios internacionais no Polaris Awards, em Londres. “Naquele momento, o propósito era mostrar força política. Não era pra todo mundo — era pro meu eleitor. Campanha é energia. Você precisa entender com quem vai gastar a sua.”

O case, premiado em 2023 como uma das melhores campanhas do mundo, sintetiza a filosofia de Juarez: compreender o contexto emocional do eleitorado é mais decisivo do que qualquer fórmula ou estética. “Esqueçam os vendedores de fórmulas mágicas”, alertou. “A comunicação é viva. Ela se move conforme o sentimento público se move.”

De Bauman a Bolsonaro: a engenharia das emoções políticas

Entre uma pausa e outra, o estrategista transformou o auditório do Ilha Tech num laboratório de pensamento sobre política contemporânea. Citou exemplos que vão de campanhas locais a fenômenos globais — de Nikolas Ferreira a Jair Bolsonaro — para mostrar como a conexão emocional cria viralidade e molda narrativas.

“Bolsonaro em 2018 não foi fruto do acaso. Ele conseguia falar com núcleos específicos, por meio de emoções específicas: raiva, indignação, esperança, nostalgia. Ele produzia sentido emocional dentro de um sentimento macro de cansaço e revolta. E comunicação é isso: reconhecer o sentimento que já está pulsando e amplificá-lo.”

Em sua visão, a comunicação política brasileira é marcada por uma criatividade que, muitas vezes, substitui a ausência de formação acadêmica sólida na área — uma constatação que ele leva como desafio e esperança. “A disciplina do marketing político ainda é nova. Falta teoria, mas sobra prática. O nosso diferencial é transformar essa prática em arte, é fazer da intuição um método.”

Juarez Guedes e a urgência de reaprender a escutar o eleitor

A política como experiência humana

Em vários momentos, Juarez fez da fala uma espécie de confissão profissional. “Esses encontros são como uma árvore”, disse no início da palestra. “Você vê as pessoas passando pelas mesmas dores, pelos mesmos desafios. E isso nos reconecta com o propósito de por que fazemos o que fazemos.”

Com a naturalidade de quem já acumulou campanhas em todas as regiões do Brasil — e um currículo que inclui formações na UCA (Argentina) e na George Washington University (EUA), além de prêmios como os NapolitansPolaris e CAMP de Democracia —, Juarez Guedes não apenas palestrou: ensinou a pensar comunicação política como ciência da escuta e arte do vínculo humano.

“Tudo começa pela emoção”, concluiu. “A atenção nasce da conexão emocional, e essa conexão só existe se a mensagem for relevante o suficiente pra tirar o eleitor da inércia. É a partir dessa conversação pública que o voto acontece. É ali que a política se faz viva.”

Ilha Tech: palco da inteligência política contemporânea

A fala de Juarez encerrou uma tarde em que o Ilha Tech reafirmou seu papel como espaço de inovação e pensamento estratégico no Nordeste. A Conferência Território, realizada no último dia 30 de outubro, reuniu alguns dos maiores nomes do marketing político nacional, num debate que transitou entre filosofia, tecnologia e prática eleitoral.

Mais do que um “esquenta” para as eleições de 2026, o encontro revelou algo maior: o renascimento de uma comunicação política que escuta, sente e se move.

E se há algo que ficou ecoando após a fala de Juarez Guedes, foi a lembrança de que, entre algoritmos e dados, o que ainda decide uma eleição é — e sempre será — a emoção humana.